
Ainda me lembro de quando a Avenida Brasil começava a ter seus primeiros congestionamentos. Ficávamos ansiosos e tensos porque o trânsito começava a interferir diretamente em nossa rotina de deslocamento para o trabalho. Com o passar do tempo, fomos obrigados a sair mais cedo de casa e ficarmos mais tempo dentro de um ônibus. Nosso sono também sofreu sérias influências pois passamos a dormir mais cedo por poder acordar, pelo menos, uma hora antes. Eram adaptações que o mundo moderno começava a imprimir em nossas vidas, exigindo maior sacrifício. Isso sem contar que os ônibus começavam a ficar cada vez mais cheios pois a força-de-trabalho crescia sem o correspondente crescimento na frota de ônibus. O cáos sempre é produto do descompasso entre oferta e a procura. Estamos falando do começo da década de 70, onde nem se pensava que o trânsito for para padrões cada vez mais piores. Nem o advento do metrô pôde trazer benefícios concretos aos que necessitavam do transporte coletivo. Acresce que, nesse tempo, nem passava pela mente das "iluminadas" autoridades o surgimento do transporte por kombis, vans, motoboys, mototaxis e assemelhados. Hoje vemos baleiros, biscoiteiros, vendedores de água-mineral, de cerveja (pasmem!) e de refrigerantes, caminhando em plena pista central da Av. Brasil,

anunciando o congestionamento. O mais interessante é que esses que se arriscam no alfalto a serem atropelados por motociclistas, que passam em alta velocidade entre os carros no seu pára-e-anda diário, têm sempre suas mercadorias próximas aos pontos de estrangulamento, e todos - são dezenas, - posso afirmar - são especialistas nos produtos que vendem. Há uma logística toda especial, porque, congestionou? Lá estão eles, um exército de vendedores volantes, oferecendo algo que possa "forrar" o nosso estômago na hora do "rush". Era garoto, quando meu pai levava da Vila da Penha até o Castelo, viajando sentado, no ônibus 71 - Lapa-Irajá, pouco mais de 40 minutos. E eram ônibus que não desenvolviam muita velocidade, as pessoas dirigiam com mais cuidado e com maior responsabilidade. O fenômeno do "stress" era somente para pessoas em postos de comando nas empresas de grande porte, como as grandes companhias de departamentos: Mesbla, Sears...hoje com suas portas cerradas. Sinais dos tempos. O homem é o mesmo, mas a exigência das carreiras e as demandas que a nova sociedade impõe são radicalmente diferentes dos tempos setentões, para quem quer gozar de status e assegurar o sucesso custe o que custar. "Não há cafezinhos grátis" e há um preço alto para quem começa agora essa nova jornada. Fico com minhas lentes, como assistente que sou do príncipe do tempo, mas não vejo escapatória de mudança nos apertos que o mundo capitalista introduz na economia mundial, e, de quando em vez, vemos a pátria do capitalismo influir no mercado, adquirindo o controle de duas companhias de gestão imobiliária que já vêm operando com acentuada inadimplência de seus clientes. Antes que a chamada "bolha" pudesse explodir e envolver a economia estadunidense como um todo, coube ao governo americano tomar essa decisão pouco ortodoxa, de cunho intervencionista, para salvar o país de Tio Sam, de uma catástrofe com respingos em todos os seus parceiros do G7 e nos países emergentes. Vivemos momentos sem precedentes na história do mundo. O terror, o medo ao terror, o avanço da teoria conspiratória perspassando todas as áreas da atividade humana, paradigmas que vão ao chão e outros valores antigos que aparecem de novo, como se houvesse um ruído entre o novo e o velho e ninguém conseguisse descrever o que é um e o que é o outro. A história do mundo cada vez mais questionada, como se o que aprendemos nos bancos escolares estivesse bem distante da verdade dos fatos. Homens ilustres hoje não são mais tão ilustres assim. Alguns ícones do passado que almejavam a igualdade e a liberdade têm sido alvo de revisão de seus valores, de sua visão de mundo, de suas intenções sociais...Enfim, estamos vivendo os tempos dos desenganos,das descobertas mais chocantes, das decepções mais deprimentes com aqueles que acenavam a verdade como a luz no fim dos tempos. A Avenida Brasil está toda congestionada, a escuridão é total, os buracos acabam com os veículos, os pardais eletrônicos sempre alerta para nos punir por um cochilo na velocidade...Meu pai jamais chegaria cedo ao trabalho se quisesse enfrentar essa avenida usando sua rotina de mais de 30 anos atrás. Ele já está na nuvem de testemunhas há mais de 10 anos e já sabe que o Lapa-Irajá é sombra do passado porque até o ponto final, onde ele, minha mãe e eu esperávamos o ônibus, comendo um gostoso cuscus, já é passagem de veículos, virou mais uma rua, e congestinada...
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